Está em curso uma mudança no sistema fabril que pode significar um novo
estágio da revolução industrial. Hoje, comprar um robô custa
praticamente o mesmo que pagar o salário de um operário chinês. Dados
preparados pela consultoria Gavekal mostram que o custo unitário de um
robô industrial atingiu cerca de US$ 48 mil no ano passado, uma
diferença pequena para os US$ 44 mil pagos a um funcionário pela gigante
de montagem Foxconn durante dois anos.
Na verdade, os chineses recebem menos que isso na Foxconn - que, entre
vários outros produtos, faz os iPhones e iPads da Apple -, mas o cálculo
considera um fictício operário que trabalhasse 24 horas - como um robô.
As jornadas de trabalho da China são pesadas, mas ainda não chegam a
tanto. O resultado dessa aproximação de custos é que até a Foxconn já
anunciou que pretende "empregar" 1 milhão de robôs até 2014.
Outra
evidência do avanço da robótica é que a demanda por robôs industriais
está indo além do setor automotivo, que já é tradicional nessa área. Em
2006, as montadoras respondiam por 36% dos robôs utilizados no planeta.
Esse porcentual caiu para 28% em 2010. O setor elétrico e eletrônico,
que detinha 18% dos robôs, saltou para 26%. Também se destacam os
fabricantes de plásticos, produtos químicos e cosméticos.
"Estamos diante de uma tecnologia de ruptura. O excesso de mão de obra
vai deixar de ser uma vantagem e as empresas vão começar a retornar para
países com mão de obra qualificada, baixos custos e boa
infraestrutura", disse José Roberto Mendonça de Barros, sócio-diretor da
MB Associados. "A robótica é um dos fatores que vai ajudar a indústria a
renascer nos Estados Unidos".
Mendonça de Barros projeta que, até 2015, o mundo vai assistir atônito a
uma mudança radical nas relações de trabalho. Yuchan Li, analista da
Gavekal baseada em Hong Kong e autora dos cálculos, disse ao Estado por
e-mail que "é difícil colocar um prazo definitivo, mas que há sinais de
que a revolução já está ocorrendo". Segundo ela, as mudanças são mais
rápidas em alguns países, como a Coreia do Sul, do que em outros.
O movimento é inevitável
De um lado, o esforço de países como a China para reforçar o mercado
local, melhorando a renda e as condições de trabalho, acaba elevando os
custos da mão de obra. De outro, os robôs acabam sendo beneficiados pela
chamada Lei de Moore. Gordon Moore, um dos fundadores da Intel, previu,
na década de 1960, que a capacidade dos microprocessadores dobraria a
cada dois anos. Isso faz com que os eletrônicos possam ser, a cada ano,
mais potentes e mais baratos. E o mesmo acontece com os robôs.
Substituição. A crise global enfrentada desde a quebra do Lehman
Brothers ajudou a acelerar o processo, porque forçou as empresas a
buscar novas maneiras de reduzir seus custos e melhorar suas magras
margens de lucro. Mas são duas tendências estruturais, para as quais não
há sinal de alteração no curto prazo, que alimentam o processo: a queda
do preço dos robôs e o aumento dos salários, particularmente na China,
mas também no Brasil. Marcos Noma, dono da empresa paranaense, conta que
os robôs que utiliza chegavam a custar R$ 800 mil há 10 anos e hoje não
passam de R$ 200 mil. "Foi isso que permitiu o nosso investimento",
diz.
A queda dos preços globais dos robôs não foi tão significativa quanto
relata o empresário brasileiro, mas não deixou de ser relevante. Entre
2000 e 2010, o custo médio de um robô industrial caiu 23%, conforme a
Gavekal. A consultoria não possui dados tão antigos para os salários na
Foxconn, mas entre 2003 e 2010, a remuneração dos operários da empresa
na China cresceu 140%.
Considerada o chão de fábrica do mundo, os custos na China estão
subindo porque o país não vai conseguir oferecer trabalhadores
suficientes para acompanhar o crescimento da manufatura global, apesar
do seu 1,3 bilhão de habitantes. Muitas empresas estão elevando sua
produção a uma taxa anual de 10%, enquanto a oferta de trabalho na China
cresce apenas 2% - reflexo da política do filho único adotada pelo
governo comunista.
A China deve continuar a ser uma grande produtora global de
manufaturas, mas é provável que daqui para frente as empresas instaladas
no país se dediquem cada vez mais a atender o mercado interno, cujo
consumo precisa acelerar para garantir um crescimento sustentável da
economia. Empresas americanas e europeias, que produziam na China para
atender seus mercados de origem, já começam a fazer o caminho de volta.
Os populosos e pobres países asiáticos, como Vietnã ou Bangladesh,
devem ser os mais prejudicados pelas mudanças tecnológicas, mas o Brasil
não vai passar imune. Algumas empresas brasileiras começam a recorrer a
robôs para melhorar a qualidade e fazer frente a falta de mão de obra
qualificada. O grande problema é que a indústria brasileira enfrenta
hoje uma séria falta de competitividade, por conta da infraestrutura
ruim e da segunda energia mais cara do mundo, o famoso custo Brasil. Com
os robôs substituindo chineses, são esses fatores que vão determinar a
instalação da indústria global nos novos tempos.
Por Raquel Landim e Renato Cruz / Estadão
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